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Homem saiu de MS e virou escravo por dois anos em zona de guerra no Sudão

Homem cumpria jornada de trabalho que variava de 14 a 17 horas diárias e recebia com atraso

Lavoura de feijão de empresa pela qual trabalhador foi contratado. (Foto: Reprodução Facebook) Lavoura de feijão de empresa pela qual trabalhador foi contratado. (Foto: Reprodução Facebook)

Cumprindo jornada de trabalho que variava de 14 a 17 horas diárias e recebendo sempre com atrasos, trabalhador de Mato Grosso do Sul atuou em situação análoga à escravidão no Sudão, país africano em conflitos constantes e sob ameaças de rebeldes.

Em maio de 2018 a vítima acionou a Justiça contra o abuso que sofreu entre agosto de 2014 e maio de 2016 como operador de máquinas agrícolas em lavoura na cidade de Damazin. Ele chegou a ser refém de terroristas que atuam em guerrilhas no Sudão.

No último dia 14 de abril, desembargadores do TRT24 (Tribunal Regional do Trabalho da24ª Região) determinaram o cumprimento da sentença de 1º grau – de julho de 2019 - que definiu indenização que pode chegar a R$ 493.370,98, que é valor da ação.

“Conforme se depreende do aludido depoimento, não há dúvidas da situação perigosa e de extrema tensão a que o demandado submeteu o autor na prestação laboral, porque

além da vexatória e humilhante, eram degradante no que tange à alimentação, descanso e realização de necessidades fisiológicas”, conforme entendimento do desembargador relator, Francisco das Chagas Lima Filho.

Conforme o processo, depois de voltar de férias, em 2015, o trabalhador “foi detido por soldados africanos no dia em que chegou na vila, que fica a 60km da lavoura, sendo liberado somente no dia seguinte”.

Também não havia banheiro para uso dos trabalhadores, maioria brasileiros que atuavam no mesmo regime análogo à escravidão. Além disso, eram apenas 20 minutos de descanso diário entre as jornadas de trabalho.

O réu, que é empresário no Brasil e também no Sudão, se defendeu dizendo que atuava segundo as normas trabalhistas no país africano, mas para os magistrados.

“A legislação brasileira, contrariamente ao que sustentado pelo recorrente (réu), adotando o princípio da norma mais favorável ao trabalhador, permite e garante, independentemente do previsto nas normas do país da execução do contrato, a aplicação daquela brasileira ou estrangeira que, em seu conjunto, seja mais favorável ao trabalhador, que, no caso concreto, é a brasileira”.

Com o acórdão, o trabalhador deverá receber R$ R$ 22.352,00 em salários atrasados, mais R$ 15 mil em indenização por dano moral. Há ainda valores a serem calculados com base no salário que a vítima deveria ter recebido por mês, que é de R$ 7.222,00. O réu foi condenado também a assinar a carteira de trabalho do autor diante do período em que atuou no Sudão.

A decisão cabe recurso, no entanto, a possibilidade é restrita, uma vez que há jurisprudência de outros tribunais com casos semelhantes que depõem contra a impetração pelo réu.

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